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Crítica: Ela

O filme narra um futuro não muito distante no qual é possível para os humanos terem amigos virtuais, mas não como o que costumamos entender como amigos virtuais nos dias de hoje, mas sim verdadeiras inteligências artificiais, que vão além até mesmo da mente humana. Seres ilimitados, que conseguem se conectar com seu “usuário” detectando sua personalidade através de sua voz, gestos, comportamento, de maneira que consiga se encaixar perfeitamente no que aquela pessoa precisa.


Isto seria basicamente a solução perfeita para todos os problemas de alguém solitário, que não consegue interagir com o meio social, se relacionar longamente com alguém, ter uma vida amorosa sólida. A questão é: quando se pode ter alguém perfeito e que te entenda em cada pensamento do seu interior, quem iria querer qualquer outra coisa?

Theodore (Joaquin Phoenix), um homem comum, um tanto introspectivo, com alguns poucos amigos, que está passando por um doloroso processo de divórcio com a ex-mulher que ele ainda ama, Catherine (Rooney Mara), acaba procurando conforto com um desses “Sistemas Operacionais” (OS’s), adotando assim a inteligência artificial Samantha (voz de Scarlett Johansson) como sua nova parceira de vida, sua melhor amiga, sua secretária, sua faz-tudo.

Aos poucos, vai se tornando cada vez mais dependente da máquina, a levando para todos os lugares, em cada momento da sua vida, quando sai com os amigos, em aniversários, no trabalho, ela sempre está lá, para quando ele precisa dar aquela fugida da realidade, aquela escapada por um minuto que seja.

Quando Theodore anda na rua, nós vemos as pessoas passando por ele, cada uma delas com um fone de ouvido conversando com seus próprios OS’s. Nota-se que quase ninguém mais anda em dupla ou grupo, apenas sozinhas com seus aparelhos, cada uma presa em seu mundo particular, vivendo sua realidade idealizada onde não há problemas, porque o computador era a pessoa exata que eles almejavam, tornando o companheirismo humano obsoleto. Os relacionamentos pessoais, as amizades, tudo coisa do passado. As pessoas não precisavam mais uma das outras, elas tinham a internet (qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência).

Se vendo alardeado por tamanha perfeição, uma mulher tão incrível que ele julgava ser impossível, Theodore de repente se encontra apaixonado por Samantha, levando para um nível mais intenso ainda a sua dependência. E eles iniciam um relacionamento ideal, ela sempre está lá disposta para ele, vivendo em função dele, a cada momento, segundo, minuto, falando o que ele queria ouvir.

Ao tentar entender os motivos que o levaram a se divorciar da ex-mulher, Catherine, ele percebe que foi porque ambos mudaram, e ela não o acompanhou, e ficou insuportável a convivência, que o tempo fez ficar intolerável. Porque, no final das contas, todo mundo mudava, mas o ser humano não é capaz de processar as mudanças um do outro, apenas as suas próprias, fazendo com que os relacionamentos se tornem quase inatingíveis.

O filme é genial em vários aspectos, que se eu fosse mesmo falar sobre todas as mensagens que é possível captar com ele, sairia um livro. Portanto, é preciso ressaltar apenas algumas, e a mais impressionante é como ele nos faz enxergar como nossa sociedade estar caminhando exatamente para isso: o extremo individualismo. Ninguém quer realmente ouvir ninguém, quer apenas ser ouvido. Ninguém quer entender ninguém, quer apenas ser entendido. E a partir do momento que a outra pessoa vai se tornando diferente daquilo que você estabeleceu como perfeito para você, tudo desanda.

Theodore via em Samantha sua válvula de escape, ela era tudo que ele precisava, porque ela era DELE. E ele fala isso enfaticamente em uma cena específica, ele queria que ela fosse dele e somente dele. Mas como todos os programas de computador, ela está o tempo todo se atualizando – em tempo bem mais rápido que nós seres-humanos. Samantha vai aos poucos evoluindo para um ponto que Theodore não pode atingir, de uma maneira não literal, ocorre o mesmo que ele alega ter ocorrido entre ele e Catherine. Ela mudou, e ele não mudou junto com ela.

O longa transmite que nada substitui a possibilidade de estar com alguém, real, físico. Nós devemos olhar e prestar atenção nas pessoas que estão ao nosso redor, mesmo com suas limitações, erros, inseguranças, imperfeições, e não ficar tentando encaixar milimetricamente cada particularidade sua a do outro, tentando buscar sempre uma perfeição que não existe e nunca vai existir, porque nós mesmos não somos perfeitos, de modo que quando tentamos lidar com algo que atingiu este grau tão utópico – como é o caso dos Sistemas Operacionais – quem acaba deixando a desejar somos nós.  

Agora tecnicamente falando, as atuações estão magníficas, Rooney Mara e Amy Adams, mesmo aparecendo pouco fazem o que estão acostumadas a fazer, ótimas atrizes as duas. Mas o show mesmo fica por parte de Joaquin Phoenix que está fazendo algo diferente de tudo que ele já fez; Theodore é meigo, sensível, extremamente normal, tímido, bem diferente dos homens estranhos ou marrentos que ele costuma interpretar (sempre muito bem, por sinal), e claro, Scarlett Johansson que é simplesmente a estrela do filme, nossa, surpreendente como ela o foi sensacional apenas com a voz! Cada risada, cada tom meio rouco, doce e curioso, como o de alguém que está descobrindo todo um mundo novo em uma rapidez difícil de digerir, e que vai aprendendo a lidar aos poucos com os sentimentos humanos que ela vai adquirindo à medida que conversa com seu usuário. Estupendo!

Para mim esse filme merecia bem mais indicações ao Oscar, mas fico feliz que esteja concorrendo a Melhor Filme, porque sem dúvida, a crítica e a mensagem que ele passa é altamente atual e muito bem explorada. Aprovadíssimo!



nanomag

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